quinta-feira, outubro 04, 2007

A pedra.

No diálogo com quem defende opiniões que eu critico a diferença de opinião é o menor dos problemas. A diferença no método de formar opiniões, que exemplifiquei com o ateísmo no último post (1), é um problema pior. Em vez de escolher uma hipótese porque acredito nela escolho a que se aguenta quando duvido de todas. Isto faz alguma confusão se assumem que defendo uma posição por crença ou convicção.

Mas o pior problema é a diferença de atitude. Por exemplo, este comentário da leitora Ana Rita:

«Não atirem a pedra... Olhem primeiro para as vossas atitudes antes de julgarem quem não conhecem ou assuntos que nada vos dizem...» (2)

Falo por experiência quando digo que uma crítica é muito melhor que uma pedrada. E mesmo com uma pedra metafórica, conotar a crítica com algo mau e desagradável revela um problema fundamental. Olhemos então para esta atitude.

Muitos crentes coexistem ignorando as crenças dos outros. Chamam-lhe «respeitar» as crenças, mas não é respeito nenhum. É fazer de conta que cada um vive no seu universo separado. Uns vão pela astrologia ocidental, outros pelo tarot, outros pela astrologia chinesa, auras, linhas da palma da mão, a íris e o que mais, e ninguém estranha a esquizofrenia de tantas personalidades diferentes que esta parafernália atribui a cada pessoa. Por vezes o «respeito» é tanto que um crente segue várias crenças incompatíveis ao mesmo tempo.

Mas respeitar é levar a sério. Se respeito alguém, o respeito e a honestidade exigem que o avise quando me parece que diz um disparate. Porque se quer compreender as coisas é do seu interesse perceber os erros e debater ideias. Uma critica fundamentada é uma forma de colaboração. É como se corrige os erros e se aclara o raciocínio. Mas muitos crentes vêm a crítica como antagonismo, e essa atitude é a barreira mais difícil de ultrapassar.

Dentro desta categoria, o comentário da Ana Rita até é dos mais razoáveis. Permite um diálogo melhor que aqueles em letra maiúscula a chamar-me ignorante ou os que ameaçam mandar encerrar este blog. Ou os que se ofendem, vão se embora, não querem discutir, ou nem querem cá aparecer. Noutro comentário, a Ana Rita acrescentou:

«Para pensarmos o que quer que seja acerca de um qualquer assunto temos que ter bases e informação para que o possamos discutir de uma forma coerente...»

E a melhor forma de ter essas bases e informação é pelo diálogo. Um excelente exemplo é o do Nelson Lima, o director do Instituto da Inteligência. Respondeu a muitas das críticas, aceitou algumas, e penso que todos que participaram no diálogo beneficiaram da troca de ideias.

Finalmente, o cerne da questão:

«Antes de pormos em causa o nosso semelhante, tentemos perceber se está certo ou errado...»

É pondo em causa que se percebe se está certo ou errado. A critica fundamentada aponta um possível erro e dá oportunidade ao outro de explicar porque não é um erro ou de se corrigir se concordar que é. É assim que se progride, e o progresso científico atesta o sucesso desta abordagem. Por outro lado, o medo da crítica é o primeiro indício de treta.

1-Ateísmos
2-Socorro!

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