domingo, junho 14, 2015

Treta da semana (atrasada): paroquial.

O “desafio do Charlie Charlie” consiste em equilibrar um lápis em cima de outro, em cruz, e depois invocar o espírito do tal Charlie que, se alinhar na brincadeira, fará mexer o lápis de cima. Este alegado desafio tem se tornado popular, compreensivelmente mais popular do que usar só um lápis e esperar que o Charlie escreva qualquer coisa. Apesar do sistema dos lápis cruzados ser menos informativo, como o lápis de cima se mexe ao mais leve sopro dá ideia de resultar melhor do que se fosse preciso que espíritos e demónios existissem mesmo (1). Como escreve Gonçalo Portocarrero de Almada, «Que o demónio existe, não é pacífico. Muitas pessoas o negam, remetendo a sua existência para o imaginário de antigas fábulas ou de inverosímeis mitos religiosos.» No entanto, Almada defende que «demónios [...] existem e actuam, mesmo que neles não se acredite» e adverte que, «Seja ele um Charlie mexicano, ou francês, o melhor é não lhe dar troco»(2).

Há vários aspectos merecedores de crítica nesta posição defendida por Almada e muitos sacerdotes e fiéis católicos. Estas tretas dos demónios são mesmo fábulas antigas e mitos inverosímeis, pelo que é disparatado defender que tais coisas existem com base apenas em textos escritos por quem vivia no tempo dessas fábulas e mitos. É também ridículo que adultos com formação, numa sociedade moderna, receiem que equilibrar um lápis no outro leve a possessão demoníaca. Mas hoje vou deixar esses aspectos de parte e focar um terceiro que também me faz espécie. A tese dos demónios que a Igreja Católica defende é de um paroquialismo tal que é evidente ter sido inventada para, e por, pessoas que não conheciam mais do mundo do que a aldeia onde viviam e o campo onde pastavam as cabras.

Reza esta história que um deus omnipotente criou todo este universo e também seres espirituais «dotados de inteligência e vontade [...] criaturas pessoais e imortais» que «Excedem em perfeição todas as criaturas visíveis»(3). São os anjos, os mensageiro desse deus. Mas um anjo decidiu ser mau. É estranho que uma criatura espiritual, criada por um deus perfeito e excedendo em perfeição tudo o que é visível, acabe por dar para o torto como qualquer desgraçado que tenha sido maltratado pelos pais ou nascido com tendências psicopatas. Mas admitamos que sim. Siga a história. Temos então uma criatura espiritual, mais perfeita que tudo o que é visível, mas que é má. O que é que faz então essa criatura, com tal poder e perfeição, para alcançar os seus desígnios maléficos? Segundo Almada, cria em nós tentações e faz com «que uma pessoa, que não sabe latim, se expresse nessa língua, ou que revele dados da consciência de alguém que só o próprio, Deus e, pelos vistos, o demónio conhecem». E é isso.

Este aspecto das religiões é mais uma boa razão para ser ateu. O universo tem treze mil milhões de anos, milhões de galáxias, cada uma com centenas de milhões de estrelas e, alegadamente, os seres mais poderosos nisto tudo comportam-se como se fossem pastores da idade do bronze com poderes mágicos. O deus que cria galáxias com um pensamento anda terrivelmente preocupado com a possibilidade do Zézinho se masturbar no duche ou da Maria casar com a Isabel. E o príncipe do mal, criatura eterna e perfeita, viu as primeiras estrelas nascerem, a Terra formar-se e os dinossauros extinguirem-se enquanto esperava por esta espécie de mamífero para agora pôr umas freiras a dizer palavrões, a vizinha do quinto a falar Latim ou o Sr. Sousa a ter um caso com a secretária. Isto ultrapassa até os sérios problemas da falta de evidências, das conclusões precipitadas e das más explicações que assolam a generalidade dos relatos religiosos. Isto já é gozar com as pessoas.

1- Livescience, Charlie Charlie Challenge: Can You Really Summon a Demon?
2- Gonçalo Portocarrero de Almada, Coisas do diabo
3- Vaticano, Catecismo

3 comentários:

  1. E ainda por cima ignorante. Levou Cristo a um monte tão alto de onde se viam todos os reinos da terra.

    Ora Cristo podia ter aproveitado para lhe dar a ele e a todos uma boa lição de geografia.

    Também a proposta que faz a Cristo, que é omni tudo, de lhe dar poder político faz tanto sentido como os metralha levarem o tio patinhas à caixa forte e deixarem - no tirar o que quiser...

    E se a morte de Cristo era o início do fim do diabo este tinha todo o interesse em usar os seus amplos poderes para evitar por todos os meios a morte de Cristo.

    Bastavam uns cagaços a dirigentes romanos e judeus e ficava a guarda romana e judia a guardar Cristo 24 sobre 24.

    Em vez disso mete 2000 demónios, certamente estagiários , à espera de Deus todo poderoso....

    Claro que fizeram propaganda a Cristo e lá acabaram no mar dentro de porcos.

    Depois deste falhanço continua numa estratégia incompreensível.

    Segundo as profecias o diabo é derrotado no fim.

    Até lá pode ir coleccionando almas mas sabe que no fim está condenado.

    Logo a estratégia deveria ser atrasar a concretização das professa o mais possível.

    E coleccionar almas.

    Uma perda notável de almas é o aborto e a mortalidade infantil. São almas que lhe passam ao lado sem lhes poder tocar.

    As profecias falam também de apostasia e guerras.

    Assim o diabo deveria ser o campeão da luta anti aborto ,vacinação em massa e cuidados de saúde generalizados.

    Um inimigo feroz das guerras e epidemias várias e más doutrinas...

    Em vez disso põe o asdrubal a falar latim.

    Não parece ser o Einstein.

    ResponderEliminar
  2. E ainda por cima ignorante. Levou Cristo a um monte tão alto de onde se viam todos os reinos da terra.

    Ora Cristo podia ter aproveitado para lhe dar a ele e a todos uma boa lição de geografia.

    Também a proposta que faz a Cristo, que é omni tudo, de lhe dar poder político faz tanto sentido como os metralha levarem o tio patinhas à caixa forte e deixarem - no tirar o que quiser...

    E se a morte de Cristo era o início do fim do diabo este tinha todo o interesse em usar os seus amplos poderes para evitar por todos os meios a morte de Cristo.

    Bastavam uns cagaços a dirigentes romanos e judeus e ficava a guarda romana e judia a guardar Cristo 24 sobre 24.

    Em vez disso mete 2000 demónios, certamente estagiários , à espera de Deus todo poderoso....

    Claro que fizeram propaganda a Cristo e lá acabaram no mar dentro de porcos.

    Depois deste falhanço continua numa estratégia incompreensível.

    Segundo as profecias o diabo é derrotado no fim.

    Até lá pode ir coleccionando almas mas sabe que no fim está condenado.

    Logo a estratégia deveria ser atrasar a concretização das professa o mais possível.

    E coleccionar almas.

    Uma perda notável de almas é o aborto e a mortalidade infantil. São almas que lhe passam ao lado sem lhes poder tocar.

    As profecias falam também de apostasia e guerras.

    Assim o diabo deveria ser o campeão da luta anti aborto ,vacinação em massa e cuidados de saúde generalizados.

    Um inimigo feroz das guerras e epidemias várias e más doutrinas...

    Em vez disso põe o asdrubal a falar latim.

    Não parece ser o Einstein.

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  3. Sempre que vejo "cenas" do género das descritas no post do Ludwing, lembro-me do episódio de Carlos, o emissário de há 2 mil anos atrás (quem não conhece pode ouvir do próprio James Randi em https://www.youtube.com/watch?v=y0hgP3ioAeA e/ou http://skepdic.com/carlos.html).

    É incrível a necessidade que as pessoas demonstram em acreditar. Acreditar, mesmo sem mais nada, excepto uma fé pura e dura!

    Uma resposta fácil, é que muitas vezes (a maior parte?) são novidades fabricadas pelos media para vender; eles também não confirmam, apenas lhes interessa saber se a história tem potencial para vender.

    Mas as respostas fáceis, normalmente não são as melhores. Deixo uma pergunta: será que parte desta responsabilidade, desta coisa de simplesmente acreditar sem ter nada que confirme, não é da Igreja Católica e de outras organizações religiosas, que com o intuito de também eles venderem a sua mensagem, não acabam por gerar pessoas que são capazes de se alhear do mundo e simplesmente acreditar?

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